21 março, 2010

Palestina Livre




Li e gostei muito de um livro do Edward Said chamado "Cultura e Resistência". É uma série de entrevistas do intelectual sobre o conflito Israel x Palestina. Fiquei com bastante raiva e quis ir jogar pedras nos tanques israelenses, mas por hora o que faço é me irritar, comprar uma camiseta e postar aqui. (Que revolucionário eu)

Comprei o livro quando o meu amigo Rogério estava folheando e viu um poema e me mostrou. Segue o poema com uma pequena explicação.

Carteira de Identidade

Toma nota!
Sou árabe
Número da identidade: 50 mil
Número de filhos: oito
e o nono...já chega depois do verão
E vais te irritar por isso ?

Toma nota!
Sou árabe
Trabalho numa pedreira
Com meus companheiros de dor
Pra meus oito filhos
O pedaço de pão
as roupas e os livros
arranco da rocha...
Não mendigo esmolas à tua porta,
nem me rebaixo
no portão do teu palácio
E vais te irritar por isso ?

Toma nota!
Sou árabe
Sou nome sem sobrenome
Paciência sem fim
Num país onde tudo o que é
Ferve na urgência da fúria
Minhas raízes...
Antecedem
o nascimento do tempo
o princípio das eras
o cipreste e a oliveira
a primeira das ervas

Meu pai...
De família na terra
Sem nobreza entre os seus
Meu avô
De presença no arado
Nem distinto nem bento
Sem nome nem renome
Sem papel nem brasão
Minha casa, só choça no campo
de troncos e tábuas
E ela te agrada?
Sou nome sem sobrenome!

Toma nota!
Sou árabe
Cabelos negros
Olhos castanhos
E o que mais?...
A cabeça coberta com Keffyya e cordão
Dura como pedra
Rija no toque
a palma da mão...
E o melhor pra comer?
Azeite e zaatar

O endereço?
Uma aldeia isolada...esquecida
De ruas sem nome
E homem...
No campo e na pedra...
E vais te irritar por isso?

Toma nota!
Sou árabe
Arrancaste as vinhas de meu avô
a terra que eu arava
Eu, os filhos, todos
Nada poupaste...
Pra nós, pros netos
Só pedras, pois não
E o governo, o teu, já fala em tomá-las
Pois então!
Toma nota!
No alto da primeira página
Não odeio ninguém
Não agrido ninguém
Ao sentir fome, porém,
Como a carne de quem me viola
Atenção...cuidado...
Com minha fome...com minha fúria!

É um poema que na verdade se origina de sua experiência pessoal de ter que se registrar num gabinete israelense. Até 1966, os palestinos em Israel estavam sob a norma militar israelense, então tinham que se reportar constantemente, se registrar. Ele, num jeito desafiador, diz ao homem, "Anote que sou árabe". Isso, involuntariamente, se tornou a primeira linha do poema.

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